segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

NEM MAGRINHA E NEM GORDONA, SEMPRE GORDINHA


            Era assim que eu me via, comprar roupa sempre foi um tormento, eu pegava a peça, olhava para a pessoa ao lado, conhecida ou não e perguntava, você acha que serve pra mim?

Nunca gostei de experimentar roupas nos provadores, pra fechar calças tinha que ser sempre deitada, e quando fechavam nunca ficavam como eu gostaria que ficasse, se eu comprasse sem experimentar ficava com a ideia de que serviria até chegar em casa, depois eu guardava para o dia que fosse servir.

Meu guarda-roupa tinha tanta coisa que não servia, a desculpa era posso emagrecer, posso engordar, posso usar como figurino no teatro eu não dava nada. Durante algumas dietas eu ia separando numa sacola tudo o que ia ficando largo, porque queria medir o emagrecimento através da quantidade de calças que foram deixando de servir, mas logo voltava a usá-las.

Antes dos 49 anos eu nunca tinha chegado no meu peso ideal, mas muitas vezes cheguei perto do peso ideal, fazia alguma dieta mirabolante emagrecia e quando estava quase no peso ideal engordava tudo novamente e mais um pouco, cheguei a trabalhar em terapia o medo de ser magra.

Quando vejo minhas fotos de bebê, me acho muito fofa, as que tem dobrinhas eu acho ainda mais linda, minha mãe fez um álbum com os fotógrafos que passam nas casas prestando esse tipo de serviço e eu adoro minhas fotos, elas estão embaixo do vidro da escrivaninha do meu quarto de solteira e eu tenho o desejo de leva-las para o loft que deve ser minha próxima moradia.

Quando criança eu não era gorda, mas mamei até os 7 anos de idade e tinha fotos mamando, uma delas, com a mamadeira numa “tonquinha” e o cabelo todo bagunçado, acabei perdendo quando deixei com o meu primeiro psicólogo na época da faculdade.

Dos 5 aos 7 anos usei bota ortopedia e depois até os 9 um sapato preto, estilo boneca, com palmilha, quando a moda eram as sandálias  “Melissinha”

Me recordo que odiava ter que tomar banho quando saia da aula de natação no “Peixinho Dourado”, os chuveiros não tinham porta, eu ia bem rápido e me enrolava na toalha, que vergonha,  eu pré-adolescente já me sentia gordinha e inapropriada.

Quando tinha concurso de miss na rua eu sempre me oferecia pra fazer parte do júri, lembro de estar com uma roupa bonita o cabelo bem arrumado, está vindo em minha memória um detalhe do vestido de noiva da minha mãe no penteado que ela me fez mas não tenho certeza se isso é real ou fruto da minha imaginação vou precisar checar, mesmo bem arrumada eu jamais seria páreo para a minha prima e amigas.

Eu me desenvolvi muito rápido, a Priscila também mas ela tinha corpo de bailarina, mas as outras meninas eram magrelas, podiam colocar qualquer roupa, eu tinha um pernão, um bundão e isso fazia eu parecer uma menina mais velha, uma vez um homem mexeu comigo na rua, estávamos saindo do Hospital Amigo na Dom Pedro e o homem passou de carro e mexeu,  lembro que o meu pai ficou furioso com o homem.

Eu gostava de colocar bermudinha colada e camisetas largas, enrolava a camiseta atrás pra mostrar a bunda e soltava ela na frente pra esconder a barriga, uma vez eu estava indo pular carnaval na matinê do Aramaçan com as minhas amigas, e quando dei tchau para o meu pai ele me fez voltar e trocar de roupa, chorei muito, coloquei uma outra bermudinha de lycra preta mais comprida mas assim que sai na rua enrolei ela, eu queria ser sexy, os meninos passavam a mão nas meninas e isso me ofendia ao mesmo tempo que me deixava envaidecida.

Na quinta-série sai da escola pública e fui pra privada, agora além de feia era pobre ... Aff! Em quatro anos fui convidada para seis festas, e isso era pouco, porque eram muitas festas eu via o povo entregando os convitinhos e eu ficava de fora, duas eu não fui, uma era da minha prima, e as outras três que dificuldade arrumar roupa pra ir e comprar presente.

As lojas de marca não tinham roupas que serviam em mim, meus pais já não tinham dinheiro pra ostentar e mesmo se tivessem nada me servia, fui ter a primeira calça da Zoom eu já trabalhava, usei até acabar, toda rasgada no meio das pernas por conta das coxas.  Tive um Nike que a lingueta até saiu de tanto puxar pra aparecer a marca, tive um iate comprado na Mesbla rasgou no dedão, tinha um chulé horrível e quando minha mãe jogou fora eu enlouqueci.

Eu andava muito com a minha prima Priscila, e ela sempre foi muito linda, loira, fazia ballet, tinha casa na praia, estava sempre bronzeada com aqueles pelinhos da perna loirinho, eu me comparava e me sentia sempre inferior por conta da imagem corporal, sempre gordinha. Quantas noites dormi com uma meia fina na cabeça pra alisar o cabelo, que enrolado que não me permitia ter a franjinha da moda, o cabelo repicado da moda,  foi enrolar bem na adolescência, época em que qualquer espinha parece um tumor, como eu queria ser igual todo mundo, que fase difícil.

Quando entrei no Ensino Médio, mudei de escola, comecei a trabalhar e o corpo ainda era um problema, tantas dietas. Com 14 anos tive um namoro que três meses e com 15 anos tive um namoro que durou um ano e três meses, esse segundo namorado me chamava carinhosamente de gorda e eu a ele de magrelo, apesar de ter conseguido namorar nesta época eu estava sempre fazendo dietas para emagrecer. Com 17 anos eu comecei a fazer teatro e o teatro mudou minha relação com o meu corpo e com o meu medo do que pensariam de mim, o teatro fez com que eu valorizasse o meu corpo e o meu pensamento, era uma gordinha feliz, sempre gordinha independente do peso na balança.

Até os 48 anos engorde e emagreci milhares de vezes e em alta velocidade, conheci meu ex-marido eu estava com 74 quilos, o objetivo naquela época era vestir o vestido do baile de debutante no aniversário de 40 anos, casei 1 anos e cinco meses depois com 91 quilos num vestido plus size.

Durante a pandemia cheguei a 107 quilos, tenho muitos vídeos desta época, além das aulas gravadas para os alunos, organizava uns eventos virtuais para a família pelo whatsapp, vou anexar alguns deles, eu não me incomodava com foto, vídeo, era a mesma gordinha de sempre com 70gs ou 100kgs era a gordinha desencanada com a imagem corporal.

https://youtu.be/pWOJ7f1ElLA?si=_rBOsyeHM_J6OiSG (acesso em 20 de janeiro de 2025)

https://youtu.be/dgZwuHbRKQg?si=iwlDC3_waksYMS45 (acesso em 20 de janeiro de 2025)

Porém, quando cheguei no meu peso ideal, pela primeira vez na vida eu ouvi de uma nutricionista agora é manter, eu ainda me via gordinha, somente quando fiz a abdominoplastia em outubro de 2023 que olhei para o espelho quando ia tomar banho e vi exatamente o meu corpo como é, que experiência incrível que continuo vivendo um dia de cada vez.